Um ponto em que venho refletindo há um tempo com relação ao ensino de biblioteconomia no Brasil é: até que ponto um doutorado em CI é bom para formar bibliotecários? Cada vez mais temos doutores com graduação em diferentes áreas, e experiências profissionais idem, ensinando biblioteconomia e formando bibliotecários. Até que ponto isso é bom para a profissão?
Art. 6o – São atribuições dos Bacharéis em Biblioteconomia, a organização, direção e execução dos serviços técnicos de repartições públicas federais, estaduais, municipais e autárquicas e empresas particulares concernentes às matérias e atividades seguintes:
a) o ensino de Biblioteconomia;
b) a fiscalização de estabelecimentos de ensino de Biblioteconomia reconhecidos, equiparados ou em via de equiparação
E não pode ser diferente disso. Se para ser bibliotecário é preciso ser formado em biblioteconomia e ser regitrado no conselho, como se pode ter pessoas que nunca trabalharam com biblioteconomia formando bibliotecários? Claro, existem disciplinas que podem ser ensinadas por pessoas de áreas diferentes, e outras que só um bibliotecário para ensinar para os futuros. A questão é que é difícil definir quais são essas disciplinas, por um lado, e como a pós em CI já existe há um temmpo por aqui, alguns curriculos de biblioteconomia se tornaram vazios no tocante à biblioteconomia, em prol de uma pretensa formação em CI. Dia desses descobri que minha amiga secreta do BSF, Amanda, não tem no currículo a disciplina História do Livro e das Bibliotecas, tem algo parecido com isso. Pelo amor dos meus filhinhos, como se formam bibliotecários que não estudam história do livro e das bibliotecas?
Por outro lado, temos também professores “biônicos”. Que terminam a graduação, emendam com mestrado, emendam com doutorado e vão ensinar biblioteconomia. Cadê a experiência? Cadê o cotidiano do bibliotecário no ensino? Não tem.
Isso tudo, a meu ver, prejudica sobremaneira a formação dos futuros bibliotecários. Que ao terminar o curso precisam aprender a ser bibliotecários na prática, e muitas vezes não é nada fácil.
A meu ver, uma saída é ter mais profissionais nas salas de aula, independentemente de ter títulos. Vale muito mais 10, 15 anos ou mais à frente de uma biblioteca do que um pós-doutorado em CI. Estamos formando bibliotecários, e não cientistas.
Levanto a discussão nesse momento, pois é de acordo com a lei atribuição do Conselho fiscalizar o ensino de biblioteconomia. E isso definitivamente não vem sendo bem feito.
27 respostas para “Ensino de biblioteconomia ou de ciência da informação?”
Como crítico assumido dos currículos de Biblioteconomia que existem em todo Brasil tenho algumas palavras que de maneira alguma quero que depreciem a imagem de qualquer profissional.
A Biblioteconomia está acabada. Calma… digo isso da formação e do ensino que é feito, com exceções para que a regra seja confirmada, nos estabelecimentos de ensino superior.
Outra coisa é interessante de se notar: lá em 1970 (corrijam o ano caso não seja esse; sou péssimo com datas) quando o IBBD lançou o curso de Mestrado em Biblioteconomia o aluno recebia uma carga, do que podemos chamar, de “tópicos avançados”: representação descritiva avançada, representação temática avançada, e assim por diante. Obviamente, com a sociedade e a tecnologia avançando a passos largos, esse tipo de estudo não foi para frente. E é por aí que vejo a Biblioteconomia perder muito. A formação do bibliotecário é tão tecnicista ao ponto de sair da graduação “sabendo arrumar livros”, e só. Ele não teve na formação (e nem demonstrou interesse em saber) sobre como se dava a organização de conteúdos em redes sociais, por exemplo. Ele vive encaixotado, fechado hermeticamente num mundo de metalinguagens que só ele entende, quando deveria aproximar o usuário da informação.
E esse já é outro problema: quando aproxima o usuário da informação, o bibliotecário acha que sua tarefa está acabada, podendo ir para casa e dormir tranquilamente, e assim passa o resto da vida numa sala 4mx4m cheirando a mofo, catalogando, indexando e classificando. É um consumidor de conhecimento e não demonstra preocupação em produzir nada.
Mas após esse resumo (destruidor, admito), por que o bibliotecário quer fazer Mestrado em CI? Na minha visão, porque ele acha que a CI é tão parecida com a Biblioteconomia que “é dele”, como um direito garantido (para os que querem, claro) e como uma extensão da graduação. E olha que hoje em dia eu vejo a Comunicação tão mais ligada à CI do que a Biblioteconomia…
Por fim, creio que os professores que estão por aí não tem a regra da prática porque a própria Biblioteconomia com isso está dizendo que é existe a necessidade de mudanças. Será que o título do post poderia ser “A Biblioteconomia quer ser CI?”.
Isso deve dar mais uns bons posts de discussão. Abraços e não se sintam ofendidos.
Claro que essa discussão passa pelo “o que é biblio?” e “o que ci?”. Biblioteconomia é uma técnica. Nada mais, nada menos. E a CI brasileira é o que?
De repente, “back to basics” seja o melhor a ser feito. Uma formação de 2, 3 anos em biblio “hard core”, para ser somada a uma formação clássica em alguma ciência. Dois dos maiores bibliotecários brasileiros defendem mais ou menos isso, Edson Nery da Fonseca e Luis Milanesi.
Precisamos começar a escutá-los. E lê-los.
Desde os tempos de faculdade defendo a idéia de que nosso curso deveria ser em nível de pós graduação…e vendo o rumo das coisas, acredito nisso agora mais do que nunca. Abs!
Eu também, Cláudia. Edson Nery clama por isso há pelo menos 4 décadas.
[…] aprendi a compreender melhor a cultura informacional na pós-modernidade. Tudo isso se liga a uma outra discussão, e minha visão é que o papel da Universidade é formar pessoas capazes de resolver questões […]
Eu acredito também que o ensino em nível de pós para bibliotecários formaria sem dúvidas melhores profissionais, mas acho que no atual contexto brasileiro seria um tiro no pé, pois limitaria ainda mais a quantidade de profissionais que entram no mercado.
Quanto a história do livro e das bibliotecas, também não tive. Mas sinceramente não sei se sinto falta, até gostaria de saber por curiosidade… eu tenho a impressão que meu curso não tem isso por não limitar o foco às bibliotecas, já que temos uma matéria de biblioteca e sociedade já. Posso estar enganado.
Quanto a questão principal, eu até concordo contigo, pois vejo muitos professores de outras áreas que dão aulas bem limitadas por não conhecerem alguns fundamentos básicos da área e não terem a vivencia necessária.. mas também acredito que em alguns casos, pode se ganhar muito com diferentes pontos de vista e outras ricas experiências que podem nos agregar muitas coisas..
Sim, sem dúvida outros profissionais agregam. Eu não disse o contrário. Mas a questão é: agregam em que, como, e até que ponto. Como eu disse, para mim, mais vale 10 anos de experiência em uma biblioteca do que um pós-pós-PHD em CI em Stanford, afinal estamos formando bibliotecários e não cientistas.
Cara, você com certeza seria um bibliotecário ainda melhor se tivesse estudado “história do livro e das bibliotecas”. Não tenha dúvida disso. Mas a questão não se limita apenas a esta disciplina. Em alguns cursos de biblioteconomia não tem mais “introdução à biblioteconomia” e sim “fundamentos ou introdução à ciência da informação”. Entende? Você vai ser bibliotecário mas não foi introduzido à biblioteconomia, e sim à “Ciência da informação”. E se fizermos um estudo, veremos que a coisa é mais feia. Minha reflexão vai nesse sentido. Claro que temos ótimos professores que não são bibliotecários, temos ótimos professores que nunca trabalharam em biblioteca, temos ótimos professores que tem pós-PHD.
A questão é que estamos deixando de formar bibliotecários com base na realidade da biblioteconomia brasileira e estamos formando um vago “profissional da informação”.
Trabalho em bibliotecas jurídicas há pelo menos 8 anos. Conheci muitos juizes, advogados, promotores e procuradores que são professores, independentemente de serem mestres ou doutores. Ensinam pois atuam na área e estão formando futuros profissionais. Mas nunca trabalhei com nenhum bibliotecário que também ensinasse em um curso de biblioteconomia. Existem, eu sei, mas em número muito pequeno.
Pois é Gustavo. Neste ano completo 26 anos de formada e tive a oportunidade de presenciar algumas ótimas falas do Edson Nery, do Briquet e de outros icones da nossa área (para mim pelo menos). Abs!
A discussão sobre o bibliotecário, sua formação e, principalmente, suas atitudes frente ao mercado provavelmente serão eternas. No meu modo de ver é a soma de todos fatores que contribuiu para que ainda não se valorize a Biblioteconomia e talvez por isso está se tentando cada vez mais abarcar conteúdos da CI dentro da Biblio.
Eu gostaria de lecionar em um curso de biblioteconomia. Mas veja o percurso: para ingressar em uma universidade federal como docente, eu preciso ter ao menos o título de mestre, e preferencialmente em áreas “correlatas”. E isso, é só o começo, para não entrar na questão da completa dissociação das linhas de pesquisa com o mercado, da estúpida necessidade de titulação como prova de competência e mérito, e por aí vai.
E precisa ainda fazer parte da “panelinha”da Escola
[…] Ensino de biblioteconomia ou de ciência da informação? […]
Um passo importante que vejo em áreas com problemas de definição é: esqueçam os conselhos, esqueçam essa reserva de mercado. São raras as áreas que realmente precisam desta especialização, a maior parte ganha com a troca. Existem inúmeros bibliotecários que atuam em TI por exemplo, por sorte da área, pois trazem a luz da informação para um grupo tipicamente tecnocrata. A contrapartida também é verdadeira, ou é possível imaginar bibliotecários sem entender o digital? Acredito que a regulação do mercado seja a melhor maneira de melhorar os currículos de graduação. Estes devem ser uma resposta ao mercado e não o contrário. Tente imaginar a academia impondo ao mercado que a melhor tecnologia é proprietária? Ficaria correndo atrás do próprio rabo, apenas.
O que acontece por aqui é uma lentidão na formação dos currículos da bibliotecnomia que não percebo em outras áreas. Acho que é problema do legado. O mercado de TI já nasceu no Brasil com esta mentalidade mais liberal, ao passo que a bibliotecnomia ainda luta contra o legado de profissionais enferrujados. Mais um motivo para deixar de lado esta reserva que os torna inflexíveis.
[…] não é fácil e talvez por isso tenhamos tamanha agitação em vários posts de vários blogs [1] [2] [3] [4] [5] [6]. A partir da observação dessa discussão, e também de dar meus pitacos por aí, […]
Uma pimenta nesta discussão:
143.106.58.55/revista/include/getdoc.php?id=656&article=166&mode=pdf
E uma citação para pensarmos:
“As delicadas funções de um bibliotecário não se limitam a ordenar e classifcar
os tesouros confiados à sua guarda. Mais do que tudo é ele o auxiliar diligente dos estudiosos,
o guia natural dos que fazem investigações de qualquer natureza …”, de:
http://www.conexaorio.com/biti/ramiz/index.htm
Uma pimenta nesta discussão:
http://www.fae.unicamp.br/etd/viewarticle.php?id=213
E uma citação para pensarmos:
“As delicadas funções de um bibliotecário não se limitam a ordenar e classifcar
os tesouros confiados à sua guarda. Mais do que tudo é ele o auxiliar diligente dos estudiosos,
o guia natural dos que fazem investigações de qualquer natureza …”, de:
http://www.conexaorio.com/biti/ramiz/index.htm
É isso que o bibliotecário. Por isso que devemos formar bibliotecários e não “cientistas” nem “gestores” da informação.
Como bibliotecário há mais de 2 décadas,tenho Venho lamentando constantemente a atual formação dessas últimas gerações. Sinto que os cursos tem se modernizados apenas nas nomenclaturas das disciplinas, mas pouco tem investido na formação desses discentes no tocante a prática do SER bibliotecário.
Há tempos que não vejo os discentes discutirem a importância da leitura para a conscientização do cidadão, projetos que desmistifiquem ser a biblioteca um espaço apenas para letrados…
Há! não tenho dúvidas que os atuais cursos de Biblioteconomia espalhados pelo país, estejam longe de cumprir com o seu papel que é de formar profissionais que estejam preparados para trabalhar em prol da maioria da população, hoje, esquecida por nós Bibliotecarios…e constante assediada pelas politicas eleitoreiras.
Tenho APENAS graduação pela UFPE, atuei em Biblioteca Comunitária (a 1ª do pais), Popular, ônibus Biblioteca, Pública, Escolar e Especializada… atuei no Diretório Academico da UFPE(1987) resgatando os ENEBD’s, Associação de Biliotecários de PE (1996-98) e Conselho Regional de Biblioteconomia (2000-02) com grandes projetos de responsabilidade social: bibliotecas em presidios, FUNDAC e SUVAG (escola especial).
Não senti falta de nenhuma pós garduação para poder atuar de maneira consciente para fazer chegar na mao da população a tão discutida INFORMAÇÃO nos cursos de Biblioteconomia e CI…
Bom ver você por aqui, Marcílio! Concordo com você em tudo. Abraço!
Oie passei para fazer uma visita!
Realizei um sonho ao me formar Bibliotecária Documentalista (Primeira turma em 1990 pela Sociologia e Política SP) com essa de nominação;e de lá pra cá exerci,batalhei para que as pessoas conhecessem o que é o papel do profissional desta área.Briguei pelos salários(nas empresas) arrumei,intermediei vagas e empregos para outros colegas. Mostrei a força de nosso papel na política(anonimamente)intermediei a compra da Primeira Constituição Brasileira,com livreiro amigo, conseguimos em tempo recorde enviar à Brasília para embasar o processo de Impecheament do Color,enviei à Portugal livros raros, criei e implantei Mostras Internacionais e eventos importantes dentro de Bancos,dei treinamento de uso de Bibliotecas -TUB-(desde o funcionário mais simples até a nível de diretoria de um grande Banco)na Av. Paulista,tudo documentado e devidamente registrado,criei projetos para multinacionais de alta sigilosidade (sem gerenciamento físico – codificado). Tudo porque nunca quis ser “Babá de Livros”, como muita gente dizia ser a minha profissão. Só estou contanto tudo isso para que os jovens profissionais não admitam que nos classifiquem como ultrapassados e sem expressão. Sou muito realizada com tudo o que fiz. Atualmente estou escrevendo esta trajetória. Um abraço a todos que estão atuando e sem dúvida tornando o mundo melhor.
Caros colegas,
Sou professor no curso de Biblioteconomia da UFES e entendo bem o que Gustavo está dizendo. E também entendo o posicionamento dos outros contrários a ele. O que acontece é que existe claramente uma luta por espaços entre Biblio/Documentação e CI. A CI que surgiu caudatária das duas primeiras por investir mais em pesquisa e ter nos seus quadros pesquisadores que têm mais poder de formar opinião tenta passar uma idéia de atraso da Biblio por não trabalhar com TI, o que é uma mentira. A formação em Biblio da mais destaque a biblioteca sim, e daí, a Arquivologia da mais destaque ao arquivo, sim, a CI dará destaque ao quê? Vai trabalhar onde, em que? Toda disciplina que não tem espaços definidos de trabalho acabam pro lutar pela retirada de conselhos e orgãos de classe pois não tem esses órgãos definidos para si. Acho que o bibliotecário, se for de seu interesse pode buscar especialização na área de TI, de Gestão de informação mais ligada ao mercado privado, mas isso não impede um curso de se preocupar com seu core, que tem muito de tradicional. A CI está engatinhando ainda para se firmar em sua próprias pernas como campo teórico, como campo profissional não sabe ainda nem que profissão vai formar e não me venha com essa lenga lenga de que na sociedade da informação as profissões irão acabar e que a competência é que importa mais pois isso é outro papo furado que não se sustenta. Pois a competência se adquire primeiramente é na formação superior em uma profissão e depois é que o mercado vai escolher, e nem sempre escolhe o melhor e sim o que mais lhe convir no momento.
Ps: acho que a universidade não deve formar sem olhar para o mercado, ele é muito importante, mas não pdoe ser refém desse mecanismo de organização da sociedade, posi ele muda o tempo inteiro e a formação numa universidade é muito mais do que preparam mão de obra para o mercado.
Olá Alimeteia! Legal ver você participando! Concordo em tudo contigo. Só não sei o que podemos fazer para melhorar a situação. Será que o CFB poderia fiscalizar mais rigorosamente as escola de biblio? Você sabia que são raros os professores de biblio em UF´s que mantém o CRB? É engraçado, pois exigem o CRB para trabalhar, mas para ensinar, não. Outro ponto é que os professores que formam bibliotecários pouco participam dos eventos profissionais de bibliotecário (CBBD e SNBU). Para eles, só conta o ENANCIB. Entre outras coisas que só afastam a academia da realidade, e deixam os futuros bibliotecários entregues à própria sorte.
Mas voltando ao ponto, o que nós podemos fazer? Vamos cobrar de quem?
Sinceramente não entendo muito bem a diferença da pessoa que se forma em CI e o formado em Biblioteconomia.
Vou prestar vestibular no final do ano e não consigo compreender a diferença. Tudo o que venho lendo sempre mistura um pouco as duas áreas.
Atualmente trabalho em uma biblioteca e já iniciei o curso em Biblioteconomia anteriormente na FESPSP.
Pelo que percebi, aqui temos pessoas de grande conhecimento e vivência na área. Gostaria de saber se podem me ajudar.
Muito obrigada!
Eu amo todas as mensagens, eu realmente gostei, eu gostaria de mais informações sobre isso, porque é muito bom., Obrigado por compartilhar.
Ótima reflexão, Gustavo. Ago que tem me assustado é saber que alguns desses professore sem formação em Biblio tem inclusive tentado abolir ou diminuir a carga horária de disciplinas fundamentais como as de organização da informação, que a meu ver já são poucas nos currículos brasileiros. Esse pensamento tem deixado para outras profissões tarefas e inovações que deveriam partir da biblioteconomia. Sou aluna de doutorado em CI e na minha opinião nossos curso de pós formam pesquisadores e não docentes.
Isso mesmo, Paula. Estamos num processo que só piora. Uma pena.